Análise Beira-Mar - De Filipe Matzembacher e Marcio Reolon

01 dezembro 2015 Nenhum comentário


Beira-mar é uma poesia desenhada a quatro mãos, esculpida cuidadosamente pela dupla Filipe Matzembacher e Marcio Reolon, responsáveis pelo roteiro e pela direção, em um intrínseco  movimento único, soberbo e soberano. Os dois, como se fossem um, expõem as almas de dois jovens, amigos, que viajam até uma cidade litorânea para resolver uma pendência familiar de um dos dois, e não é no caminho que as coisas acontecem, nunca foi e não será, é no movimento parado, dentro de uma casa cheia de janelas e vidraças, corredores silenciosos e luz branca, fria, que ficam expostos dois mundos em construções, duas almas que buscam reconhecer-se.

Martin e Tomaz surgem pela primeira vez em cena apenas como penumbra, sombras, as setas que indicam os caminhos a ser seguidos esta bem acima das cabeças deles. Dali em diante, aos poucos vão se mostrando, suas almas criam forma lentamente, Beira-mar inicia silencioso, sem eco, vazio. Vidros molhados, imagens embaçadas, poucas palavras e uma estrada longa pela frente. A frescor, a primeira oportunidade que temos de realmente perceber a intensidade de vida existente nos personagens é quando finalmente chegam na casa de destino. O mar, peça fundamental na história, é percebível apenas pelo movimento das águas, o quebrar das ondas e o ruído dos ventos. Martin e Tomaz irão ter um final de semana intimamente conturbado, e nós, expectadores, presenteados com uma das histórias mais bonitas, contadas pelo cinema brasileiro.


O roteiro é direto, sem barulho, sem clichês, sem dramaticidade forçada, sem o desnecessário. Filipe e Marcio assumem o risco de passear pela mente juvenil sem parecer caricato, eles conseguem sair do comum. Do cotidiano. Daí a importância de tudo ter vida dentro desse filme, a casa de vidro abraça os dois garotos, o mar assiste todos os movimentos, o carro é o meio de transição da realidade quente de Porto Alegre para o frio intimista de Capão da Canoa no Rio Grande do Sul, e o azul, cor abstrata e lotada de leveza, ganha seu espaço, força, vigor, sua participação dentro da história é motivada pela existência de encontrar o que está perdido. Tudo incrivelmente delineado, construído, com almas de vidros e ruídos da alma, como o barulho das águas controladas pelo ar, Beira-mar é mais do que ele mesmo foi construído para ser, é imenso por dentro e por fora.
 
Desenvolvido por Michelly Melo.